Artigo

Bolívar de Abreu

Nessa pandemia do SARS-CoV-2 (Covid-19), em que a fome e miséria aumentam pelas ruas de nossas cidades, estamos carentes de Zildas e Betinhos. Gradativamente, surgem em nossas comunidades, vários Betinhos.

Por: Sergio Damião em 10 de maio de 2021

 

Constava no WhatsApp: Vila Velha, município Canela Verde capixaba, cogitava retirar o nome Zilda Arns de uma de suas Unidades de Saúde. A catarinense Zilda Arns foi médica pediatra e sanitarista e em seu trabalho constavam cinco ações: Saúde da Gestante, Aleitamento Materno, Vacinação, Soro Caseiro e o Controle de Peso da Criança (Combate à Desnutrição Infantil). Faleceu em 2010, vitima em um terremoto, durante trabalho humanitário, em Porto Príncipe (Haiti). O desconhecimento sobre Zilda Arns me fez lembrar Herbert de Souza (Betinho), o sociólogo que movimentou o Brasil no fim do século XX com a Campanha Contra a Fome, Miséria e pela Vida. Nessa pandemia do SARS-CoV-2 (Covid-19), em que a fome e miséria aumentam pelas ruas de nossas cidades, estamos carentes de Zildas e Betinhos. Gradativamente, surgem em nossas comunidades, vários Betinhos. Parecem ouvir a Zilda: “Não se enganem. Uma gotinha no oceano faz, sim, muita diferença.” Em Cachoeiro, o Centro de Saúde Municipal, apresentava-se lindamente iluminado em verde claro. Um nome se sobressai: Bolívar de Abreu. Cachoeirense, constituiu a primeira turma de médicos sanitaristas do Espírito Santo. Como educador foi Secretário de Estado da Educação de 1959 a 1962. Casado com Anna Graça Braga Abreu (Dona Gracinha), a caçula da Casa dos Braga (irmã mais nova de Rubem e Newton Braga). A poetisa uruguaia que se aproxima dos cem anos de vida, Ida Vitale, em memória exuberante que liga passado e presente, em 2005, escreve: “Regressar é/ tornar a ocupar-se/ de devolver à terra/ o pó dos últimos meses,/ receber do mundo/ o correio estagnado,/ tentar saber/ quanto dura/ uma memória de pomba./ Também/ reconhecer-se/ como uma abelha mais,/ que é para a colmeia, apenas,/ uma unidade que zumbe./ Isso, apenas uma abelha mais,/ bem prescindível.” Os pombos, dentre seus talentos, tem a capacidade de encontrar suas casas, em grandes distâncias e até vendados, como provam os pombos-correios. O seu cérebro se assemelha a uma memória de uma criança de três anos. Os cachoeirenses, bairristas como são, guardam as coisas como uma memória de pombo, por isso, retornam sempre a sua cidade e dificilmente esquecem seus homenageados, sabem que a memória de seus antepassados é a sua história.