Crônicas

Aurora

A Deusa do alvorecer. Aquela que, na mitologia, anuncia a chegada do sol (seu irmão) e encaminha o descanso da lua (sua irmã).

Por: Sergio Damião em 18 de julho de 2022

A Deusa do alvorecer. Aquela que, na mitologia, anuncia a chegada do sol (seu irmão) e encaminha o descanso da lua (sua irmã). Aurora, também, nos leva a uma claridade que aponta o início do dia, bem antes do nascer do sol. Estava em Vila Velha, onde surgiu o Estado do Espírito Santo, encontrava-me próximo das areias da Praia de Itapuã. Era um fim de semana, dias depois do solstício de inverno no hemisfério sul, do dia de São João Batista e de São Pedro. Foi um amanhecer chuvoso, bem diferente da Aurora Boreal do hemisfério norte. Da sacada do apartamento, ainda na escuridão, observei Filhinho, montava sua barraca, um quiosque improvisado no calçadão da Praia. Confiava na vinda do clarão do dia. Eu permanecia na sacada do apartamento, lia o Inventário do Azul do escritor paulista, João Anzonello Carrascoza, uma autobiografia que descreve a grandeza do azul do céu e afirma que ela nos esmaga com sua arrogante imensidão. E diz: O azul do céu não nos protege de dor alguma. Ao término do parágrafo, voltei o olhar ao Filhinho. Em sua simplicidade via bem mais que todos nós leitores e escritores. Filhinho confiava na mudança da cor das nuvens do céu. Não tentava entender ou decifrá-la. Busquei o pão para o café da manhã. Na calçada, com o guarda-chuva em mãos, alguns carros se aproximavam do quiosque improvisado do Filhinho, eram os peladeiros da areia da praia de Itapuã. De um dos carros, um som chamava a atenção. Não era Pagode, Samba ou MPB. Um Blues. Como se chorasse pela escuridão da manhã ou pelos negros dos campos de algodão do sul dos Estados Unidos; chorasse pelos negros agredidos na zona sul carioca e por todos aqueles que um dia foram escravizados ou que ainda sofrem a discriminação pela cor da pele no mundo afora. Quando retornei, ao término do café, observei um clarão pela janela do apartamento, o sol rompia as nuvens escuras, limpava o céu e o calor de seus raios alegravam a manhã do meu sábado. Caminhei até a sacada e observei Filhinho. Começava a preparar os quitutes, gelava as bebidas e a água de coco. Não olhava para o céu. Não precisava, apenas sentia, confiança de um homem em perfeita harmonia com a natureza. Pelo seu tempo à beira do mar, parecia conversar com o vento ao ouvir as vozes das ondas do mar da Itapuã Capixaba.