Crônicas
Manga
Dia desses, conversava sobre figuras folclóricas de Cachoeiro de Itapemirim. Nas lembranças surgiram Agulha e Ruimar Marques (Manga).
Por: Sergio Damião em 3 de fevereiro de 2025
Dia desses, conversava sobre figuras folclóricas de Cachoeiro de Itapemirim. Nas lembranças surgiram Agulha e Ruimar Marques (Manga). Em crônica, anos atrás, descrevi meus encontros com Manga. No nosso convívio diário, cumprimentava-o e a conversa, ou uma brincadeira, fluía. Não havia necessidade de nomes ou apelidos. Falava algo de futebol – coisas do Flamengo, algo que animava aos dois. Quem não gostava era a filha, dizia ser torcedora de times paulistas. Foi assim o ano de 2016 e anteriores: estacionava o carro sob a ponte que liga a Avenida Francisco Lacerda de Aguiar à Santa Casa de Cachoeiro. Deixava-o bem em frente ao Lavador e seguia em direção ao serviço de hemodiálise. Também, não me atentara a propaganda: Lavador do Manga. Nunca usei do serviço, ainda assim, sabia que existia segurança. Manga apresentava dificuldade em pronunciar palavras e alguns movimentos – fora acometido por um Acidente Vascular Cerebral. Agulha era diferente, parecia elétrico, palavras rápidas de difícil entendimento, não tinha pouso, irrequieto. Em 2017, 06 de fevereiro, segunda-feira, dia mais tenso da paralisação dos policiais militares do nosso estado, pela manhã, encontrava-me no pronto socorro da Santa Casa. Desci em direção à ponte, no caminho, com a rua praticamente deserta, dos carros ouvia o alerta: Rápido! Saia da rua! No carro, observei pelo retrovisor que o Manga não se encontrava. A lembrança da sua ausência foi rápida. Dei partida ao carro e busquei um lugar seguro. Viajei, por alguns minutos, pela Ponte de Ferro, através do rio Itapemirim, em meio ao caos e ao terror. No trajeto, até um lugar seguro, fui pensando no tempo de vida, nas memórias e nos sonhos. Na realidade das coisas e em nossas sensações. No dia seguinte, terça-feira, 07 de fevereiro, ainda sob a influência do medo, sem estacionar o carro, passei em frente ao Lavador. A filha se encontrava, perguntei sobre o Manga. Ela informou sobre o falecimento. Em fim de dezembro, ela disse. No dia anterior, observei motos, com peças e caixas, passavam pelo meu carro em grande velocidade (adultos e adolescentes), estavam com os produtos de saques e da barbárie que vivíamos. Ao chegar no Heci, vi um pássaro – um canário sobre a corrente que protegeria meu carro. A cor amarela do seu peito se destacava. Em fim da conversa e das minhas lembranças, uma mensagem no celular: Dom Tunico faleceu. Apaguei a mensagem e fiquei com a alegria do Tunico e o canto do pássaro.