Artigo

Angústia

Encontrava-se a alguns metros à frente da ponte central da Beira-rio (Avenida mais charmosa de sua cidade). Algo instigante para ela, local onde meses depois de distância e solidão reencontrara o amor e paixão de sua vida: Carlos.

Por: Sergio Damião em 7 de setembro de 2020

Márcia diminuía os passos. Encontrava-se a alguns metros à frente da ponte central da Beira-rio (Avenida mais charmosa de sua cidade). Algo instigante para ela, local onde meses depois de distância e solidão reencontrara o amor e paixão de sua vida: Carlos. Diminuía os passos. A decisão de minutos atrás, de não querer falar ou encontrar, já não se confirmava em sua mente, oscilava entre o querer e não querer. Muitas coisas a impedia: família, sociedade, trabalho e o medo. Insegurança que carregava por toda uma vida: desde a adolescência, entre um namoro e outro, receio nas primeiras carícias, beijos e abraços. Uma grande angústia por não saber o que decidir. Caminhava… Observava o rio e a lua. Escurecia. Logo, ouviria o sino. Logo ouviria as seis batidas (seis horas da tarde). As batidas fariam lembrar que se encontrava afastada de um conselho espiritual. Quem sabe fosse isso… Mas, em outros tempos, nos meses iniciais de seu relacionamento físico com Carlos, procurara esses conselhos, buscara os sinos das igrejas, e a paz não chegara. Encontrava-se sozinha à beira do rio. Apresentava-se diante do rio e da lua, seus companheiros de solidão e devaneios. Carlos aproximava-se, com passos curtos e cambaleantes. Ela parou e aguardou, levaria alguns minutos. Uma eternidade. Coração em ritmo acelerado, frio nas mãos, retornava à adolescência. O vento trazia um odor diferente. Era o cheiro de Carlos. O olfato, seu sentido preferido, era seu estímulo sexual. Não esquecera. Um instinto. O cheiro de Carlos a atiçava. Foi assim em seus encontros de anos atrás. Ela esperava. Lembrava o tempo da juventude e os carnavais: fantasias, o pierrô e colombina, a alegria, a música. Carlos falava ao seu ouvido: “Te amei antes de te conhecer. Foi em um dia de carnaval. Amei-te…”. Pura fantasia. Mas ela gostava de ouvir em seus encontros de anos atrás. Fantasia. Pura magia. Agora, encontrava-se em momento diferente. Um momento que poderia ser decisivo. Momento, que mais uma vez, oscilava entre o querer e o não querer. Por não saber decidir, resolveu esperar. Esperaria a chegada de Carlos, ainda que Carlos apresentasse passos lentos e cambaleantes.