Crônicas

Aos mestres, com carinho

Não há dúvida de que os ministros daquela Corte sabiam induvidosamente da prática de tortura durante a Ditadura Militar. Os áudios revelam isso de forma indiscutível, sem chance de justificativas ao contrário e que sirvam para aliviar os crimes perpetrados contra a humanidade pelo Estado.

Por: Wilson Márcio Depes em 26 de abril de 2022

Realmente países que resistem em não aprender com o passado correm sérios riscos no futuro. Sem dúvida, queiram ou não, esse é o recado dos áudios inéditos das sessões do Superior Tribunal Militar, entre 1975 e 1985, revelados recentemente pela imprensa, depois do levantamento feitos pelo historiador Carlos Fico, da UFRJ.
Não há dúvida de que os ministros daquela Corte sabiam induvidosamente da prática de tortura durante a Ditadura Militar. Os áudios revelam isso de forma indiscutível, sem chance de justificativas ao contrário e que sirvam para aliviar os crimes perpetrados contra a humanidade pelo Estado. Realmente, nesses casos, não há meio termo e não há também como ignorar. Que o digam Sérgio Bermudes, Antônio Modesto da Silveira, Sobral Pinto, Heleno Fragoso, Evandro Lins e Silva, Humberto Jansen, Rosa Cardoso, Marcello Alencar, Eny Moreira e Evaristo Moraes Filho
Àquela época, em cartas históricas notáveis, o advogado e ícone de toda uma geração, Sobral Pinto, já denunciava o fato diretamente àqueles que exerciam a presidência da República. Dizia o advogado, em carta endereçada ao General Ernesto Geisel, então Presidente da República, que “permita-me, Excelência, que ponha debaixo dos seus olhos o texto do artigo 3º, da Lei 4.898, de 9 de dezembro de 1965 que definiu como crime todas as prisões arbitrárias, efetuadas sem as formalidades legais, e o desrespeito das pessoas dos presos através do emprego das torturas a que me venho referindo”.
Dizia mais o velho mestre: “A Magistratura e os Advogados tomam conhecimento destes fatos e se veem obrigados a cruzar os braços em face dessas brutais ilegalidades, porque o Ato Institucional nº 5, de 13 de dezembro de 1968, de um lado, suspendeu no art. 10, a garantia do Habeas Corpus e, de outro lado, excluiu, no art. 11, a apreciação judicial dos atos praticados pelas autoridades civis e militares em nome da Segurança Nacional”.
Claro que a tortura, à época, para muitos alienados, se tornou uma coisa quase que normal. Isto porque se propagava uma eventual guerra contra o regime comunista. Melhor dizendo: de uma maneira geral as pessoas estavam convencidas de que tudo era permitido para combater ameaça comunista. Muita gente torcendo o nariz para a divulgação dos votos dos ministros. Absurdo. Há justificativa para divulgar agora tais gravações? Sem dúvida nenhuma de que recordá-las, agora, serve para selar o seu fim e lembrar que é importante entender que é preciso combater a ameaça de retrocesso por aqueles que tentam reescrever tão dolorosa história. O perigo mora ao lado. As eleições se aproximam.