Crônicas

De repente, é Natal

Dezembro me traz recordações profundas. Basta dizer que registra o aniversário (dia 8) de minha mãe. Lembro-me que ela se preparava para assistir ao show de Roberto Carlos.

Por: Wilson Márcio Depes em 18 de dezembro de 2023

Dezembro me traz recordações profundas. Basta dizer que registra o aniversário (dia 8) de minha mãe. Lembro-me que ela se preparava para assistir ao show de Roberto Carlos. E se emocionava. Certa feita, arrebatada pela emoção, resvalou: “O dia que Roberto Carlos morrer vou sofrer muito”. Logo após, como mineira esperta, disse: “Ô, Meu Deus! vou muito primeiro do que ele!”. E foi.

O velho e genial mestre Zuenir Ventura conta uma história que virou folclore, como lembra Joaquim Ferreira dos Santos. Era primeiro dia de um antigo mês de dezembro, quando, em Friburgo, onde o mineiro passou sua adolescência, um jornal da cidade estampou em manchete em letras de tipografia monumental: “De repente é Natal!”, gritava ela. A reclamação era dupla, duas torres gêmeas magníficas, para que a ninguém escapasse de tamanha novidade.

Claro que a notícia já tinha sido anunciada há mais de mil anos. Nada – repito – era mais previsível do que, em chegando o Natal, festejar o Salvador na manjedoura.

Zuenir sempre um foi um mestre do jornalismo e uma pessoa com um coração enorme. Assim que o conheci, na casa do Ziraldo, nos tornamos amigos pra sempre. Para tanto, no esforço enorme para defender o jornalismo, saiu com essa: “O comportamento das pessoas muda tão repentinamente na virada para dezembro que o redator da notícia sobre o Natal talvez quisesse denunciar a falsidade dos súbitos sentimentos do bom conviver”.

De qualquer maneira ainda temos o mês de dezembro para tentar, por um instante, lembrar daquela lição de Cristo que São Paulo divulgou: “Amai-vos uns aos outros”. Tão simples. Como me revelou Ziraldo, certa feita, no prefácio de meu livro de Fotocrônicas 2: “Mas, eu estava dizendo: o Drummond inventou o verbo outrar. Que beleza, sô! Uma forma nova de dizer o velho, que já devíamos ter aprendido e que está no começo mesmo das propostas de um rapaz – que morreu com 33 anos – cujo pensamento e palavras mudaram a história do mundo. Na maioria das vezes, é certo, o que ele disse entrou por um ouvido e saiu pelo outro, aí estão as bombas matando as pessoas, que, na maioria das vezes não tem nada com isso”. Mesmo assim, Feliz Natal. Que, como Drummond, possamos outrar.