Crônicas

Deu ruim…

Tenho certeza que na calçada o cidadão faziam seus pactos de convivência, viam como caminhava a humanidade municipal e, no usufruto de viver num cenário tão espetacular, respiravam.

Por: Wilson Márcio Depes em 19 de julho de 2021

Não posso negar: sempre fui apaixonado por calçadas. Das lembranças de moleque, vejo ainda minha mãe e suas amigas sentadas em cadeiras, postas nas calçadas, em bate-papo infinito Eu achava que ali elas resolviam todos os problemas do país; país, não, do mundo. Acredito até que elas eram mais eficientes que a CPI: já tinham expulsado o Bolsonaro do Governo. Tenho certeza que na calçada o cidadão faziam seus pactos de convivência, viam como caminhava a humanidade municipal e, no usufruto de viver num cenário tão espetacular, respiravam. Quando fui secretário de Planejamento na Prefeitura, ainda sob o efeito dessas recordações, tentei colocar em prática o “projeto calçada”. Quase fui esquartejado pelos donos de garagens irregulares. E olha que são muitas! Como Joaquim Ferreira dos Santos, um dos nossos mais talentosos cronistas, que conheci na casa do Rubem Braga, eu tenho medo cotidiano dessa entidade criminosa aos nossos pés plantada e das suas versões espalhadas pela cidade. São muitos acidentes. Dr. Lauro Bueno, médico e amigo, que o diga.
É verdadeiro e não é só matéria de crônica. Diz Joaquim: “Tem a calçada esburacada, a calçada desnivelada, a das pedrinhas portuguesas soltas, a que virou pista de bicicleta, a que serve de depósito para os supermercados, a que alberga mendigos, a que virou puxadinho da milícia e a que vai, como se fosse efeito visual de filme de terror, sendo levantada aos céus pelas raízes das amendoeiras”. Conta que “foi aí, em busca de espaço para fugir do contágio dos sem máscara e do atropelamento pelos sem noção, que passei a correr na calçada ao lado da ciclovia. Deu ruim. Havia uma pedra mal colocada no meio do caminho, um pedaço de descaso fora da ordem do nivelamento. Foi onde tropecei. Caí de testa, quebrei os óculos e adentrei os procedimentos hospitalares descritos, tornando-me membro, assim como acontece agora com a professora Claudia Costin, da Associação Carioca de Vítima das Calçadas”.
Como cronista e as calçadas têm saída pra tudo, diz que “não guardo rancor. A vida pós-pandemia será a céu aberto, as calçadas serão fundamentais na reconstrução de nossa felicidade. É preciso apenas, como nas demais coisas ao redor desta cidade, voltar a civilizá-las”. É o que espero de meu pequeno Cachoeiro…