Crônicas

Identificação de almas

Durante dois anos não deixamos de nos encontrar virtualmente e no grupo de WhatsApp. E decidimos agora, todos devidamente vacinados, promover uma confraternização de final de ano.

Por: Marilene Depes em 16 de dezembro de 2021

A Academia Cachoeirense de Letras reuniu-se pela última vez em dezembro de 2019, sendo que a reunião ordinária de 16 de março de 2020, no início da quarentena, foi suspensa devido aos cuidados com seus membros, grande parte composta por idosos. Durante dois anos não deixamos de nos encontrar virtualmente e no grupo de WhatsApp. E decidimos agora, todos devidamente vacinados, promover uma confraternização de final de ano.
Uma reunião simples, em que a maioria dos que residem na cidade e em condições de saúde compareceram. Da programação constava um bingo, um amigo oculto, em que poderíamos ofertar um livro novo ou um livro já lido que gostamos muito – num ato de amor e desapego. A comida foi preparada pela nossa confreira e chefe Paulinha Garruth e a música ficou por conta do musicista Renê de Oliveira.
O que houve de tão especial? A chegada de cada um e os abraços trocados transmitiram calor humano e empatia além dos limites – sentia-se o amor expandindo no ar. Antes do evento ventava e o clima apresentava-se frio, e a temperatura se modificou como por encanto. O bingo elevou o astral do grupo e entre muitas brincadeiras ele foi encerrado e iniciou-se o amigo oculto. Já participei de dezenas deles, mas confesso, nunca ouvira as pessoas falarem de seus amigos com tanto carinho, respeito e admiração. Percebia-se que todos se conheciam em profundidade, e à medida que se ia destacando as qualidades do amigo todos antecipavam e gritavam o nome, e acertavam em cheio. A literatura permite que conheçamos as pessoas, profundamente, através de seus escritos.
A Academia de Letras é composta por 40 membros, alguns não mais frequentam devido a idade avançada, por se encontrarem com problemas de saúde ou por terem se mudado para outros municípios. Temos orgulho de termos conosco membros fundadores como Evandro Moreira, Bruno Torres Paraíso e Paulo de Tarso Medeiros, e escritores – cronistas, romancistas, poetisas, historiadores, contistas, musicistas, professores, intelectuais do mais alto gabarito e que militam nas mais variadas profissões, com idade entre os quarenta aos noventa anos, a maioria com livros publicados. E entre todos destacamos a acadêmica Joacy Novaes, que com 96 anos é ativa na Academia, na produção intelectual e nas redes sociais.
Retornando à confraternização, os participantes partilharam um encontro intenso, e houve quem afirmasse que até os acadêmicos que já se foram estavam conosco. Era o sentimento que rolava no ar e nos corações, provando que a cultura vai muito além do que a racionalidade explica, e o ambiente cultural é propicio à identificação de almas. Escrevo ainda inebriada.