Crônicas

Ilusões

Não as tenho mais. Menos ainda as relacionadas com a política partidária. Quando Cazuza começou a cantar Ideologia: Quero uma prá viver, eu já havia me desiludido.

Por: Sergio Damião em 8 de agosto de 2022

Não as tenho mais. Menos ainda as relacionadas com a política partidária. Quando Cazuza começou a cantar Ideologia: Quero uma prá viver, eu já havia me desiludido. É verdade que os anos de vida, os filhos e a família nos fazem repensar a vida. Tornamos-nos pragmáticos. Risco do egoísmo. É verdade também que, ao esquecermos os sonhos e as utopias, morremos um pouco, parte de nós deixa de existir. Vibramos menos. Como os gregos diziam, perdemos o Eros. Procuramos uma paixão para substituir as ilusões. Amor, esporte, trabalho, religião, coisa material… Preferi o futebol. A paixão pelo Flamengo. Porém, dias atrás, em São Paulo, acho que voltei às ilusões, a ilusão do belo. Revi a Pinacoteca e o Museu de Arte de São Paulo. A Pinacoteca foi o primeiro museu de arte da cidade. Projetado por Ramos de Azevedo. Sua fachada é uma formosura. A arte brasileira do século XIX e XX é dominante. Uma pintura chama a atenção: Saudade. Do brasileiro Almeida Júnior. Na tela, uma jovem aparece chorando, um luto, em suas mãos uma folha, tudo leva a crer que se trata de uma fotografia do esposo, pela força do olhar e a tristeza. Uma saudade. Um sentimento que se aproxima de uma ilusão perdida. O MASP foi idealizado pelo empresário das comunicações, o paraibano Assis Chateaubriand, na década de 40 do século passado e junto com o italiano Bardi adquiriram um acervo que hoje é o maior da América do Sul (reúne obras de Rembrandt, Velásquez e Goya; dos modernistas Cézanne, Picasso e Van Gogh e do brasileiro Portinari). No fim da década de 60 a nova sede na Avenida Paulista inovava e tornava-se o maior vão livre do mundo. Um museu com arquitetura revolucionária, criado pela arquiteta Lina Bo Bardi. Em 2022, após os piores momentos da pandemia do Covid-19, com a vacinação e diminuição das restrições no convívio social, as ilusões retornaram. Mergulho e me aprofundo nas coisas belas da natureza, do pensamento e da imaginação. Naquilo que pode ser guardado na tela, escultura e grafia. A ilusão das artes é bem melhor do que a retórica. A arte da pintura é uma comunicação mais verdadeira. Ao visitar a Pinacoteca de São Paulo, ao depararmos com o quadro de Almeida Júnior, em sua Saudade, sentimos o que os olhos percebem.