Crônicas

Secos e molhados

O jornalista Ronald Mansur publicou dois anúncios datados de 1936: um de Brahim Depes, “negociante de fazendas, armarinhos, roupas feitas, ferramentas, chapéos de sol e de cabeça, calçados e louças.

Por: Marilene Depes em 7 de março de 2022

O jornalista Ronald Mansur publicou dois anúncios datados de 1936: um de Brahim Depes, “negociante de fazendas, armarinhos, roupas feitas, ferramentas, chapéos de sol e de cabeça, calçados e louças. Mantimentos e molhados, generos do paiz por atacado. E depositário do Afamado Kerozene Sol”. O outro de Gil Moreira & Cia, que vendia “armarinho, perfumaria, ferragens, chapéos, tintas, vidros, armas de fogo e munições, machinas de costura, “Calçados Souto” e artigos dentários”. Anterior aos citados, já existia a “Casa Esperança”, de 1910, cujo proprietário era pai do Dr. João Madureira Filho, ficava na praça Jerônimo Monteiro, vendia produtos similares e até bacalhau. O jornalista Sérgio Garschagen se assusta com a quantidade de ítens hoje comercializados num supermercado e recorda do armazém Marchon, da década de 50 a 60, que oferecia uns 15 produtos em média – mantimentos básicos, querosene, bacias e panelas entre outros.

As compras eram feitas com anotações em caderneta, e se pagava no final do mês, no interior o prazo se prorrogava por conta da venda do café. Em Soturno o primeiro armazém foi de Enoque Moreira da Fraga, os mantimentos eram vendidos à granel, acondicionados em sacos de estopa ou caixas de madeira e pesados em balanças com dois pratos, num se colocava o produto e no outro os pesos. Um balcão de madeira separava o freguês, não havia organização, misturava botina com guarda chuva, pinico com fardos de carne seca, fumo de rolo com cordas e linguiças. As compras eram embrulhadas num papel grosso ou colocadas em embornal levado pelo freguês. Me encantava o vidro de balas que girava repleto das de chupeta. Incrível a memória afetiva, enquanto escrevo sinto o sabor da bala e o cheiro do armazém da minha infância.

Em Cachoeiro comprávamos no armazém do João Travaglia, mas muitas produtos passavam na porta, como o leite, que vinha num tonel com torneira, o pão entregue nas casas, verduras e frutas transportados por burros, a água mineral Rainha num carro com sininho e muitas famílias criavam porcos e galinhas para comercializar.
Ainda da época dos secos e molhados num só local, grandes armazéns como o de João Depes, Assad Abguinem, Elpídio Volpini e Mamed Ali Aride se estabeleceram no Guandú. No Amarelo o do João Gomes e o Rei da Miscelânia do Aildo Fonseca, onde se encontrava tudo. Próximo a Ponte Municipal a mercearia do Armando Correia dos Reis e o armazém Coelho. Havia uma relação entre vendedor e comprador de muita confiança, e quando o primeiro supermercado foi aberto, o Guandu, os fregueses se tornaram consumidores e a partir daí a história é outra.