Crônicas

Um pouco de história

Academia de Letras de Cachoeiro de Itapemirim foi fundada em 1962, por um grupo de jovens estudantes envolvidos com a cultura da cidade, e posteriormente nela ingressaram alguns professores que partilhavam de ideais idênticos

Por: Marilene Depes em 7 de setembro de 2020

A Academia de Letras de Cachoeiro de Itapemirim foi fundada em 1962, por um grupo de jovens estudantes envolvidos com a cultura da cidade, e posteriormente nela ingressaram alguns professores que partilhavam de ideais idênticos. Eu era, na época, uma jovem estudante do Liceu Muniz Freire, e aluna de professores de ambos os sexos, e até hoje me intriga o fato de, entre elas, nenhuma ter se interessado por cultura, nenhuma escreveu crônicas ou poesias, como não se destacaram as mulheres e exímias educadoras da família Herkenhoff , que estavam à frente da Escola de Comércio. Independente das professoras, quais as intelectuais de destaque em Cachoeiro naquela época? O machismo na cultura não era privilégio da nossa cidade, em países europeus evoluídos, duas das maiores romancistas tiveram que escrever com pseudônimos masculinos para terem seus livros publicados: Amantine Dupin, conhecida como George Sand, e Mary Ann Evans como George Eliot. Para uma mulher era uma enorme transgressão se atrever a entrar num espaço predominantemente masculino. E escritoras como Jane Austen publicaram com pseudônimos, por medo de represálias – seu romance Orgulho e Preconceito, que virou filme famoso, foi editado com os dizeres: “escrito por uma dama”. No Brasil muitas escritoras também usaram os recursos dos pseudônimos para possibilitar a publicação de suas obras, o espaço da mulher se restringia ao lar e excepcionalmente ao magistério. A primeira mulher a integrar a Academia Cachoeirense de Letras foi a poetisa e cronista Alvina Baiense Freitas, conhecida pelo pseudônimo de Alma Selva , no ano de 1963, e logo após a teatróloga e prosadora Hercília Surrage Cardoso. Para as mulheres que hoje ocupam cadeiras acadêmicas, não foi fácil o próprio ingresso. Em 2017, com a morte precoce do escritor e Presidente da Academia, Roney Moraes, surgiu a oportunidade de uma mulher ocupar à Presidência, pela primeira vez após 55 anos, e fui indicada para o cargo. Lembro desses fatos na sede da Academia, tentando resgatar documentos históricos que foram destruídos pela enchente, e através deles comprovando o quanto foi ínfima a participação feminina na vida cultural de Cachoeiro no século passado. A mulher foi sempre desvalorizada, em todos os tempos da história. E o preconceito ainda se faz presente, e para aquelas que ocupam espaços alçados pela própria capacidade, a arma do não reconhecimento é colocar em dúvida os caminhos que as levaram a atingir tais espaços.