Crônicas

Uma tarde com João

João, João Vitor de Andrade Moraes, meu neto mais novo, lembra o nome do poeta pernambucano, autor de Morte e vida severina, João Cabral de Melo Neto.

Por: Sergio Damião em 31 de janeiro de 2022

João, João Vitor de Andrade Moraes, meu neto mais novo, lembra o nome do poeta pernambucano, autor de Morte e vida severina, João Cabral de Melo Neto. A grafia da identificação do poeta aparece em verso octossílabo perfeito, um conjunto de quatro nomes, três deles de quatro letras, enquanto o maior, Cabral, somado à preposição “de” totaliza oito letras. O biografista, Ivan Marques, completa: O nome do poeta é composto por palavras com números pares de letras. João, meu neto, não apresenta o equilíbrio perfeito em letras na grafia de seu nome, mas as quatro palavras, formam pares de irreverência dos Moraes, tal qual o poeta Vinicius de Moraes. Meu neto se aproxima dos dois anos de idade, nasceu em plena pandemia do coronavírus. Embora sem a expressão oral completa, a comunicação se faz por manifestação corporal: movimento de cabeça, dedo indicador e mão. Seu mundo, um mundo de pensamentos, parece um mundo de fantasias. Peço um livro para a leitura, ele traz o livro e se acomoda em meu colo e folheamos juntos as figuras dos animais. Conto algumas histórias. Ofereço o alimento, ele balança a cabeça negativamente. O sino toca, anuncia o fim de tarde. Com as badaladas ele procura o colo da avó Fabíola (Vó, Bila, para o neto mais velho: Bernardo), parece assustado ou curioso, ao ser levado à sacada do apartamento, logo se acalma, localiza a procedência do som: Igreja Nossa Senhora da Consolação. Eu nunca vi um anjo. Acho que todos nós temos um anjo da guarda, aquele que nos protege dos infortúnios e acasos. Acho, João, pela paz que irradia e pelo seu semblante, o anjo que sempre desejei ver. João, mesmo com a pandemia, começou a frequentar a escola. Em tempos passados, a creche era em nossas casas. João, em sua nova casa, conheceu vários amiguinhos, amigos da infância, daqui alguns anos não lembrará o nome desses seus primeiros amigos. Uma pena, são os melhores amigos. Descemos do apartamento em direção à garagem do prédio. Vitor, meu filho, esperava no carro. Acomodamos João no banco traseiro, a vó Bila fica ao lado, junto a janela do carro, Vitor dá a partida lentamente, João junta os dedos à palma da mão e me chama, finjo correr em sua direção, ele sorri. Uma despedida sem palavras. Fica a saudade de um fim de tarde de verão.