Crônicas

Azulix

Vitor, meu filho mais novo, anos atrás, recebeu de presente um passarinho. Na verdade, um filhote de periquito, conhecido como Calopsita. Por vários dias, com dedicação, ele cuidou.

Por: Sergio Damião em 28 de setembro de 2020

Vitor, meu filho mais novo, anos atrás, recebeu de presente um passarinho. Na verdade, um filhote de periquito, conhecido como Calopsita. Por vários dias, com dedicação, ele cuidou. Eu, nada dizia, apenas observava. Com o passar dos dias, o pequeno periquito transformou-se. Ganhou penas, as asas cresceram, ele fazia pequenos vôos pelo apartamento. Seu corpo tomou uma coloração azul e Vitor o apelidou de Azulix. Quando em visita ao apartamento, na praia de Itapoã, em Vila Velha, sentava próximo à sua gaiola, lia o jornal, ele ficava em silêncio, apenas um leve balançar de asas… Vitor, devido atividades em seu último ano no curso de medicina, passou uma temporada em Anchieta, no Programa de Saúde para a Família. Azulix permaneceu em Vila Velha sob os cuidados dos tios e avós do Vitor. Apesar das atenções, Azulix, dias depois, apresentou-se triste, não mais cantava e recusava alimentos. Parecia doente, tudo indicava algo grave, uma doença desconhecida dos humanos. O veterinário diagnosticou: Tristeza profunda! Saudades… Vitor retorna e Azulix se recupera. Em minha racionalidade estranhava a recuperação e questionava: Será uma cura aparente? Dias depois, Vitor telefonou e disse: “Azulix morreu.” Ele contou: “Quando acordei, não ouvi seu canto, procurei na gaiola, ele estava caído. Morreu durante o sono da noite. Na noite anterior, antes de dormir, ouvi seu último canto. Era um canto triste. Levei seu corpo e o enterrei no quintal do vô.” Pensei… O quintal encontra-se próximo ao morro do Convento da Penha, pela proximidade, acho que Azulix ficou encantado. Tão encantado que me lembro dele nos fins de semana que retorno à Itapoã. No último sábado estava em Vila Velha e visitei meu sogro. Ele encontra-se fragilizado, pele branca, quase transparente. Fragilizado como o Azulix em seus primeiros dias de vida. No domingo, ao retornar a Cachoeiro, fui direto ao apartamento do Vitor para visitar meu neto João. Ele, sorridente e serelepe, agitava-se nos braços do pai. Encontra-se distante das fragilidades do Azulix. Ainda assim, demanda os cuidados e precauções desta pandemia. Entre o sábado e domingo eu convivi com gerações diferentes que nos faz pensar na vida e em suas transformações.