Crônicas

Sons

No movimento vibratório da palavra escrita e pronunciada, da respiração, dos acordes da música, da calmaria do silêncio e da vida, origina-se o som.  

Por: Sergio Damião em 23 de dezembro de 2023

No movimento vibratório da palavra escrita e pronunciada, da respiração, dos acordes da música, da calmaria do silêncio e da vida, origina-se o som.  Em poucas palavras, tentava explicar, no último fim de semana, para o meu neto Bernardo, o nascimento do som.  Estava em São Paulo e na sala do apartamento. Ele mostrava várias conchas marinhas e dizia: Vô Sergio, olha o que Vô Du me deu! Vô Du disse que a concha possui um labirinto em seu interior e podemos ouvir vários sons, completou. Logo, deixamos o apartamento e seguimos em direção à escola do Bernardo. Uma escola pequena, poucos alunos e, por Bernardo ser o mais velho, era o único formando do dia. Por ser pequena e, poucos alunos, foi de fundamental importância em sua socialização. Na cerimônia de formatura do Jardim de Infância, as professoras encontravam-se emocionadas, tanto quanto os pais e avós. Enquanto discursavam, ouvia-se a música: Imagine, de John Lennon; em vídeos, as crianças falavam das nossas diferenças: cor de pele, forma de cabelos e corpo. Com naturalidade, afirmavam nossas diferenças. Com simplicidade, resumiam: precisamos de amor e tolerância. Procurei saber mais das conchas: carapaça protetora de animais marinhos de corpo mole como os moluscos. Formada de uma mistura orgânica de escleroproteína e carbonato de cálcio cristalizado. Representa: Prosperidade e sorte. Para os Astecas e Maias é a representação do mundo dos mortos e das divindades lunares. Símbolos de proteção, intuição, sabedoria e conexão com as coisas divinas. Por possuir em seu interior, semelhança a um labirinto em espiral, como uma caixa de ressonância, concentra e amplifica os sons, efeito semelhante ao barulho do mar – ecos labirínticos. Aproximei a concha do ouvido do Bernardo e disse: “… Deus ao mar o perigo e o abismo deu, / Mas nele é que espelhou o céu.” Versos da poesia de Fernando Pessoa, em Mar Português. Uma homenagem ao Vô Du, o avô lusitano do Bernardo. Por fim, lembrei ao meu neto: O grão irritante, pode ser de areia, na concha da ostra, produz a pérola. Cabe a nós perfurar as camadas da pérola em busca da partícula do grão criativo. Acho que Bernardo nada entendeu desses últimos sons. Mas ficará gravado nas palavras escritas. Um dia, quem sabe, entenderá.