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Titi

Vitor, meu filho mais novo, enviou uma mensagem no celular: Hoje, o Titi (passarinho do J.V) faleceu. Estava em Vila Velha, em frente ao mar da Praia da Costa, casa da avó materna - Vó Didi.

Por: Sergio Damião em 29 de fevereiro de 2024

Vitor, meu filho mais novo, enviou uma mensagem no celular: Hoje, o Titi (passarinho do J.V) faleceu. Estava em Vila Velha, em frente ao mar da Praia da Costa, casa da avó materna – Vó Didi. Morreu sem nenhum motivo aparente, apenas mostrava-se triste, seu canto era fraco e, por fim, desapareceu. Acho que foi por saudade do J.V. Ao tomar conhecimento, J.V se debulhou em lágrimas. Mas, agora, aparentemente, está bem. J.V, é o João Vitor, meu neto mais novo, nasceu no início da pandemia do Covid-19 (Abril, 2020). Titi, o passarinho, foi um presente do Fernando Fitipaldi, médico, amigo nefrologista e um amante dos cantos dos coleiros. Logo que chegou ao apartamento, João Vitor por dificuldade na fala, não conseguia nomeá-lo. Titi, foi assumido por todos. Coleiras, coleiros, coleirinha, papa-capim, papa-capim-de-coleira, papa-capim-de-gola ou coleirinho de gola são aves da família Thaupidae. No verão ele nos presenteia com sua beleza canora. No momento que li a mensagem do Vitor, pensei no Padre Vieira, jesuíta e escritor português, viveu no Brasil no século XVII, em um dos seus sermões: “A nossa alma rende-se muitas vezes, ou muito mais, pelos olhos que pelo ouvido. Para falar ao vento, bastam palavras, para falar ao coração, são necessárias obras.” Entre humanos, necessitamos obras; entre crianças e pássaros basta o canto. Assim como J.V, tempos atrás, derramei lágrimas, ou penso que derramei. Em face, próximo aos olhos sentia algo diferente, senti algo diferente ao ler as notícias, em jornal, do mundo social. Diferente do João Vitor, não derramei lágrimas pelas coisas da natureza: Matas, pássaros, animais silvestres ou mudanças climáticas. Em meu pragmatismo, derramei lágrimas pelas mazelas sociais em que nos encontramos, com medo daqueles que nos observam. Derramei lágrimas pelos dependentes químicos que ocupam o centro das grandes cidades, pelas mortes em balas perdidas em morros das nossas capitais e por cada vez mais se aproximarem de nossas moradias. Derramei lágrimas, sem saber o porquê. Mas logo me refugiei na poesia de Guimarães Rosa: O mundo é mágico – as pessoas não morrem, ficam encantadas… a gente morre é para provar que viveu. Era um domingo, fim de tarde, e os sinos da Consolação badalavam por Titi e todos nós.