Crônicas

Um olhar sobre Cachoeiro

Ano atrás, escrevi sobre nossa cidade: Meu olhar é simples. Outros olhares existiram, olhar dos que aqui nasceram e cresceram. Um olhar que se iniciou no século XIX e prolongou-se por todo século XX.

Por: Sergio Damião em 16 de novembro de 2020

Ano atrás, escrevi sobre nossa cidade: Meu olhar é simples. Outros olhares existiram, olhar dos que aqui nasceram e cresceram. Um olhar que se iniciou no século XIX e prolongou-se por todo século XX. Foram os olhares do Newton e Rubem Braga, Raul Sampaio, Athayr, Evandro, da Marília, Ariete, do Wagner, Jackson, Wilson Márcio e Marilene Depes… Esses olhares foram espalhados e compartilhados com o mundo. O meu olhar é o olhar do século XXI, de morros ocupados, de trânsito caótico, de um rio alternante em volume de água, ainda assim, um olhar de encantamento com os primeiros raios do sol por cima do Itabira e do Frade e a Freira. Sobram-me emoções com o nosso vale. Ao amanhecer, acompanho o vermelhão em volta das nossas montanhas. Por instantes, pareço um colibri diante da orquídea, ele parado no ar, apenas um leve balançar de suas asas, suficiente para absorver seu alimento. Assim fico eu, parado no tempo, com o olhar petrificado pelas coisas da transcendência. Em fins de semana, desço do apartamento e sigo em direção ao rio. Ainda a mesma fantasia de uma pescaria abundante. Ainda uma forte influência em nossos devaneios. Ao retornar percebo coisas da cidade, aquilo que não via por estar inebriado pelas pedras e seu rio. Vejo nossos morros desordenadamente ocupados, vejo nossas calçadas tomadas por moradores de rua… O cemitério, no Coronel Borges, as tumbas às mostras. Em cidade de um país distante, lembro ter passado por um cemitério, demorei em identificá-lo. As tumbas não pareciam casas para os mortos, lembravam uma floresta, um grande jardim, as árvores dominavam o local. Em Cachoeiro, ao caminhar, identifiquei sujeiras pelas ruas, caminhei um bom trecho para encontrar local adequado para despejar o frasco vazio de água. Da janela do ônibus, pela beira do rio, voavam papéis e latas de refrigerantes. Nesse ano que passa, a cidade foi castigada: uma grande enchente do Itapemirim e a pandemia do novo Coronavírus. O olhar sobre Cachoeiro preocupa. Preocupa, pois, as coisas que temos de belo podem ser perdidas pela falta de cuidados com a cidade que vivemos e morreremos. Os cuidados com a cidade não dependem, apenas, dos futuros administradores (Prefeito e Vereadores).